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    RELATÓRIO N° 62/02(**)CASO 12.285
 MÉRITO
 MICHAEL DOMINGUES
 ESTADOS UNIDOS
 22 de outubro de 2002
    
    I.                   
    
    RESUMO
    1.       Em 1º 
    de maio de 2000, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (doravante 
    denominada "a Comissão") recebeu uma petição do Sr. William A. Courson do 
    Magnus Hirschfield Center for Human Rights contra os Estados Unidos 
    de América (doravante denominado "o Estado" ou "Estados Unidos").  A 
    petição foi apresentada em nome do Sr. Michael Domingues, que está recluido 
    à espera de execução no Estado de Nevada.  Em 8 de dezembro de 2000 a 
    petição foi complementada por uma segunda petição interposta em nome do Sr. 
    Domingues pelo Sr. Mark Blaskey, Defensor Público do Condado Clark.  
    Posteriormente foi acordado entre o Sr. Domingues, o Sr. Courson e o Sr. 
    Blaskey que este último atuaria como único representante do Sr. Domingues no 
    procedimento perante a Comissão (doravante denominado  o "peticionário"). 
    2.       O 
    peticionário afirma que o Sr. Domingues foi condenado e sentenciado a morte 
    devido a dois homicídios que ocorreram no Estado de Nevada em 1993.  O 
    Sr. Domingues tinha 16 anos quando cometeu estes delitos.  O 
    peticionário afirma, ademais, que em 1º de novembro de 1999, a Suprema Corte 
    de Estados Unidos negou-se a revisar a decisão da Suprema Corte do Estado de 
    Nevada permitindo a execução de um condenado pelo delito cometido quando era 
    menor.  Até a data do presente relatório não havia sido fixada a data 
    para a execução do Sr. Domingues. 
    3.       O 
    peticionário alega que o Sr. Domingues esgotou os recursos internos e, 
    portanto, que a petição é admissível.  Também alega que ao sentenciar o 
    Sr. Domingues a morte por delitos cometidos quando era menor, o Estado 
    violou os artigos I,  II, VII e XXVI da  Declaração Americana dos 
    Direitos e Deveres do Homem  (doravante denominada "a Declaração 
    Americana").  Mais particularmente, o peticionário argumenta que os 
    Estados Unidos violaram o artigo I da  Declaração Americana em razão da 
    norma jus cogens internacional que proibe a execução de delinquentes 
    menores.  O peticionário também alega que o fato de que os Estados 
    Unidos não tenham impedido a arbitrariedade legislativa sistemática dentro 
    de alguns Estados da nação com respeito à aplicação da  pena de morte a 
    delinquentes juvenis acarretou uma privação arbitrária da  vida e a falta de 
    igualdade perante a lei, e por esta razão, o Estado violou os artigos I e II 
    da  Declaração.  Por último, o peticionário denúncia que a aplicação da 
     pena de morte contra o Sr. Domingues representaria uma violação dos artigos 
    VII e XXVI da  Declaração. 
    4.       Até a 
    data  do presente relatório, a Comissão não recebeu nenhuma informação nem 
    observações do Estado em relação à petição do Sr. Domingues. 
    5.       Após 
    examinar a informação e os argumentos enviados pelas partes, a Comissão 
    decidiu admitir o caso em relação aos artigos I, II, VII e XXVI da  Declaração, 
    e quanto ao mérito do caso, a Comissão concluiu que o Estado atuou em 
    violação de uma norma jus cogens internacional ao sentenciar Michael 
    Domingues à pena de morte por um delito que cometeu quando tinha 16 anos.  
    Portanto, se o Estado vier a executar o Sr. Domingues em virtude desta 
    sentença, a Comissão conclui que será responsável por uma grave e 
    irreparável  violação do direito à vida do Sr. Domingues segundo o 
    artigo I da  Declaração Americana. 
    II.       
    ATUAÇÕES PERANTE A COMISSÃO        
    A.      Observações das partes 
    6.       Em 30 
    de maio de 2000 a Comissão decidiu dar início ao trâmite do Caso N° 12.285 
    relacionado a denúncia do Sr. Domingues e mediante nota da  mesma data  remeteu 
     as partes pertinentes da  petição apresentada pelo  Sr. Courson ao Estado, 
    solicitando-lhe  que enviasse informação que considerara pertinente dentro 
    de um prazo de 90 dias, conforme o disposto no Regulamento da  Comissão.  
    Em outra nota da mesma data a Comissão informou ao Sr. Courson que a petição 
    do Sr. Domingues havia sido trasmitida ao Estado. 
    7.       Em 8 de 
    dezembro de 2000 a Comissão recebeu uma nova petição interposta em nome do 
    Sr. Domingues pelo  Sr. Mark S. Blaskey, Defensor Público do Condado Clark.  
    Em 11 de janeiro de 2001 a Comissão recebeu uma confirmação escrita do Sr. 
    Domingues assinalando que era representado pelo Sr. Blaskey e que a petição 
    de 8 de dezembro de 2000 havia sido interposta com pleno conhecimento, 
    autorização e consentimento do Sr. Domingues.  Este indicou também que 
    não havia falado com nenhum outro advogado ou organização sobre a 
    interposição da petição em seu nome e que, no caso de existir algum 
    conflicto entre as petições, desejava que a Comissão examinasse a petição 
    apresentada pelo  Sr. Blaskey. 
    8.       
    Mediante nota de 25 de janeiro de 2001 a Comissão informou ao  Sr. Courson 
    que havia recebido uma segunda petição em nome do Sr. Domingues 
    conjuntamente com uma declaração escrita deste.  Depois de novas 
    comunicações entre a Comissão, o Sr. Courson e o Sr. Blaskey, em 21 de 
    fevereiro de 2001 a Comissão recebeu uma carta do Sr. Blaskey declarando que 
    atuaria como único representante do Sr. Domingues perante a Comissão e que o 
    Sr. Courson havia concordado com esta solução.  Anexa à carta estava 
    uma comunicação do Sr. Courson confirmando este acordo. 
    9.       
    Consequentemente, a Comissão remeteu as partes pertinentes da petição 
    complementar apresentada pelo Sr. Blaskey ao Estado numa comunicação datada 
    de 5 de março de 2001, solicitando-lhe que lhe encaminhasse toda a 
    informação que considerara relevante para o caso dentro de um prazo de 30 
    dias.  Até a data  do presente relatório a Comissão não havia recebido 
    observação alguma do Estado sobre a denúncia do Sr. Domingues. 
    B.       
    Medidas cautelares 
    10.     Em sua comunicação 
    de 30 de maio de 2000 ao Estado, a Comissão solicitou a adoção de medidas 
    cautelares por parte dos Estados Unidos em virtude do artigo 29(2) do 
    Regulamento anterior da  Comissão.[1]  
    Esta solicitação foi formulada visto que, se o Estado viesse a executar o 
    Sr. Domingues antes de que a Comissão tivesse a oportunidade de examinar as 
    alegações de sua petição, sua denúncia seria inválida no que se refere a 
    possíveis reparações e causaria um dano irreparável ao Sr. Domingues. A 
    Comissão não recebeu resposta do Estado a sua solicitação de medidas 
    cautelares. 
    C.      Solução 
    amistosa 
    11.     Mediante 
    comunicações datadas de 22 de agosto de 2001 ao peticionário e ao  Estado, a 
    Comissão colocou-se à disposição das partes a fim de buscar uma solução 
    amistosa da  matéria, em virtude do artigo 41 do Regulamento da  Comissão, 
    com  base no respeito aos direitos humanos reconhecidos na  Convenção 
    Americana, a Declaração Americana e demais instrumentos aplicáveis.  A 
    Comissão também solicitou que as partes encaminhassem a Comissão uma 
    resposta a sua oferta dentro de um prazo de 10 dias, caso contrário a 
    Comissão continuaria com o trâmite regular da matéria. 
    12.     Na comunicação 
    datada de  29 de agosto de 2001, e recebida pela  Comissão em 4 de setembro 
    de 2001, o peticionário informou a Comissão que aceitava, em nome do Sr 
    Domingues a oferta da Comissão para facilitar uma solução amistosa da 
    questão.  Em 6 de setembro de 2001, a Comissão remeteu as partes 
    pertinentes da  comunicação do peticionário ao Estado e lhe solicitou que 
    apresentasse suas observações dentro de um prazo de 10 dias, caso contrário 
    a Comissão consideraria que não era possível chegar a uma solução amistosa e 
    continuaria o trâmite da matéria. 
    III.    POSIÇÕES DAS PARTES 
    A.      Posição do 
    peticionário 
    1.       
    Admissibilidade 
    13.     O peticionário 
    alega que a denúncia do Sr. Domingues é admissível de acordo com os 
    requisitos do Regulamento da  Comissão.  Afirma que o Sr. Domingues 
    apresentou uma petição ao Tribunal de Primeira Instância do Estado para 
    corregir a sentença ilegal, argumentando que a legislação do Estado de 
    Nevada está em discordância com o direito internacional, que proibe a 
    execução de delinquentes juvenis, incluindo o Pacto Internacional de 
    Direitos Civis e Políticos (PIDCP), o direito internacional consuetudinário 
    e jus cogens.  O Tribunal de Primeira Instância desacolheu a 
    petição.  Ademais, o Sr. Domingues apelou duas vezes de sua sentença 
    que estabelecia pena de morte perante a Suprema Corte de Nevada.  Em 
    sua  segunda apelação, uma maioria da  Suprema Corte de Nevada concluiu que 
    uma "reserva" do PIDCP apresentada pelo  Senado dos Estados Unidos permitia 
    a execução de Domingues.  Nem a Suprema Corte de Nevada nem o Tribunal 
    de Primeira Instância examinaram a questão da validade da  reserva nem se a 
    execução de um delinquente juvenil viola o direito consuetudinário ou jus 
    cogens.  O recurso certiorari foi apresentado perante a 
    Suprema Corte dos Estados Unidos alegando a violação do PIDCP, o direito 
    internacional consuetudinário e o jus cogens.  Em 1º de novembro 
    de 1999 a Suprema Corte dos Estados Unidos indeferiu a petição sem examiná-la. 
    14.     O peticionário 
    também denuncia que os poderes legislativo e executivo do governo dos 
    Estados Unidos indeferiram, por analogia, uma reparação efetiva para o Sr. 
    Domingues.  Alega a este respeito que, quando o Estado ratificou o 
    PIDCP, o Senado dos Estados Unidos estabeleceu uma reserva ao Artigo 6(5) 
    que proibe a imposição da  pena capital a menores de 18 anos no momento em 
    que cometeram o delito, o que priva o Sr. Domingues da  proteção deste 
    dispositivo do tratado.  O peticionário também  denuncia que no recurso
    certiorari do Sr. Domingues perante a Suprema Corte dos Estados 
    Unidos, o Procurador Geral, em nome do Poder Executivo, não argumentou que 
    não existia uma norma jus cogens que proibe a execução de menores de 
    16 anos, mas sim exortou a Suprema Corte dos Estados Unidos a não examinar o 
    caso em parte porque os Estados Unidos haviam firmado uma "objeção 
    persistente à obrigação legal até agora nos foros internacionais".[2] 
    15.     Consequentemente, 
    o peticionário afirma que foi negado ao Sr. Domingues seu direito a uma 
    apelação substantiva destas questões e que este esgotou os recursos internos 
    conforme o disposto no  artigo 31 do Regulamento da  Comissão. 
    16.     A Comissão recebeu 
    a primeira petição em nome do Sr. Domingues em 1 de maio de 2000, dentro dos 
    seis meses a partir da  data  da  sentença interna definitiva no caso.  
    Portanto, a CIDH entende que o Sr. Domingues cumpriu com as disposições do 
    artigo 32 do Regulamento da  Comissão. 
    2.       
    Mérito 
    17.     Com respeito ao 
    mérito do caso, o peticionário indica que o Sr. Domingues é cidadão dos 
    Estados Unidos, que em agosto de 1994 foi julgado e condenado por um 
    tribunal de júri em Nevada por roubo com invasão, roubo a mão armada, 
    homicídio em primeiro grau e homicídio em primeiro grau com uso de arma 
    letal.  O Sr. Domingues foi sentenciado a morte por cada uma das duas 
    condenações de homicídio.  O peticionário argumenta que a imposição da 
     pena de morte a um delinquente que tinha 16 anos no momento em que cometeu 
    o delito constitui uma violação dos artigos I, II, VII e XXVI da  Declaração 
    Americana, motivo pelo qual o  Estado deve ser responsabilizado. 
    18.     Com respeito ao 
    artigo I da  Declaração, o peticionário argumenta que existe uma norma 
    internacional jus cogens que proibe aplicar a pena de morte a 
    delinquentes juvenis menores de 18 anos.  Ao apresentar este argumento, 
    os peticionários primeiramente assinaralam que no caso de Roach e Pinkerton 
    contra Estados Unidos, que foi objeto de uma decisão  por parte desta 
    Comissão em 1987, os Estados Unidos reconheceram que existia uma  norma 
    jus cogens que proibia a execução de menores, mas que existia um 
    consenso internacional insuficiente quanto a idade para maioridade, posição 
    com a qual a Comissão concordou.[3] 
    19.     A fim de apoiar a 
    sua afirmação de que existe uma  norma jus cogens da  decisão adotada 
    pela Comissão em Roach e Pinkerton proibindo a execução de delinquentes 
    menores de 18 anos quando cometeram o delito, os peticionários citam 
    numerosas autoridades, incluindo tratados internacionais e regionais, 
    resoluções das Nações Unidas e práticas internas dos Estados.  O 
    peticionário baseia-se em particular no artigo 6(5) do Pacto Internacional 
    de Direitos Civis e Políticos que os Estados Unidos ratificaram em 1992 mas 
    fez reserva através da qual o Estado pretende preservar-se do direito a 
    impor a pena de morte a menores de 18 anos.[4]  
    O peticionário também faz referência a Convenção da  ONU sobre os Direitos 
    da Criança, em seu artigo 37(1), que proibe a imposição da pena capital por 
    delitos cometidos com menos de 18 anos. O peticionário observa que, em 30 de 
    novembro de 1997, 191 países ratificaram ou aderiram à Convenção, restando 
    apenas dois países, os Estados Unidos e Somália, que não são parte do 
    instrumento.  Outros tratados referidos pelo  peticionário em respaldo 
    a seu argumento são a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que os 
    Estados Unidos subsecreveram em 1 de junho de 1977 e cujo artigo 4(5) proibe 
    a imposição da  pena capital a pessoas que no momento de cometer o delito 
    tinha menos de 18 anos de idade, bem como o Quarto Convênio de Genebra de 
    1949, cujo artigo 68 dispõe que não se pode impor a pena de morte contra uma 
    pessoa protegida que tenha menos de 18 anos de idade no momento em que 
    cometeu o delito.  O peticionário observa a este respeito que os 
    Estados Unidos ratificaram este Tratado sem opor-se à proibição de executar 
    a menores.[5] 
    20.     Entre as 
    autoridades citadas pelo  peticionário cabe mencionar as resoluções adotadas 
    pela  Subcomissão da  ONU sobre a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos e 
    a Comissão das Nações Unidas sobre Direitos Humanos, respectivamente, em 
    1999 e 1997, as quais condenam a imposição da  pena de morte aqueles que 
    tinham menos de 18 anos de idade no momento de cometer o delito.[6]   
    Ademais, o peticionário refere-se a provas da  práctica interna dos Estados 
    que indica, entre outras cosas, que desde 1990 somente sete países do mundo 
    executaram  menores que tinham menos de 18 anos quando cometeram o delito,[7] 
    e que os estados de  Florida e Montana nos Estados Unidos recentemente 
    haviam aplicado a proibição jus cogens proscrevendo a execução de 
    menores de 16 anos.[8] 
    21.     O peticionário 
    alega também que o governo dos Estados Unidos não garantiu a adoção de um 
    critério uniforme em relação à execução de delinquentes juvenis, com o que 
    permite uma arbitrariedade legislativa sistemática em diversos Estados.  
    O peticionário alega que esta falha dá lugar à privação arbitrária da vida e 
    a inequidade perante a lei, em violação dos artigos I e II da  Declaração, o 
    que a sua vez constitui uma violação do direito à proteção especial das 
    crianças estipulado no artigo VII da  Declaração. Segundo o peticionário, 
    permitir que a aplicação da  pena de morte a um menor de 16 anos fique 
    determinada pelo  lugar em que se comete o delito significa que a política 
    dos Estados Unidos causa uma privação arbitrária da  vida e uma desigualdade 
    perante a lei.  Ao formular esta afirmação, o peticionário baseia-se na 
     decisão da  Comissão em Roach e Pinkerton, caso em que a Comissão decidiu 
    que o fato de que os Estados Unidos não impunham aos estados na questão da  pena 
    de morte a menores deu lugar à privação arbitrária da  vida e à desigualdade 
    perante a lei, em violação dos artigos I e II da  Declaração Americana.[9] 
    22.     O peticionário 
    também cita estatísticas que indicam que na data  da  petição, oito estados 
    dos Estados Unidos autorizam a pena de morte a menores de 16 anos, 15 
    estados e o governo federal fixaram a idade mínima de 18 anos, nove Estados 
    não estabeleceram limites específicos em seus estatutos e 13 estados proibem 
    a pena de morte em todos os casos.[10]  
    O peticionário argumenta que os Estados Unidos não têm feito nada para impor 
    certa uniformidade à prática dos estados de executar menores e, mais ainda, 
    que os Estados Unidos "afetaram diretamente" a obrigação que tem para com os 
    cidadãos dos Estados Unidos em virtude da  Declaração Americana ao ratificar 
    o PIDCP com una reserva inválida e contrária à proibição da  pena de morte 
    de menores.[11] 
    23.     Por último, o 
    peticionário argumenta que a imposição da  pena de morte ao  Sr. Domingues 
    representa uma violação da  obrigação imposta pela  Convenção da  ONU sobre 
    os Direitos da Criança e a Declaração Americana.  O peticionário 
    reconhece que os Estados Unidos não ratificaram a Convenção da Criança mas 
    assinala que 191 países do mundo ratificaram ou aderiram ao tratado e que os 
    Estados Unidos e Somália são os únicos dois países que não o fizeram. 
    24.     A este respeito, o 
    peticionário também assinala as obrigações assumidas pelos  Estados Unidos 
    em virtude do artigo 18 da  Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, 
    em virtude do fato de que assinou a Convenção em fevereiro de 1995.  O 
    artigo 18 dispõe que: 
    Um Estado deverá abster-se de atos os quais 
    frustem o objeto e a finalidade de um tratado: 
    (a)        
    se assinado o tratado e intercambiado os instrumentos que constituem o 
    tratado a reserva de ratificação, aceitação de uma aprovação, enquanto não 
    haja manifestado sua intenção de não fazer parte no tratado, ou 
    (b)        se manifestado 
    o seu consentimento em obrigar-se pelo  tratado, durante o período que 
    precede a entrada em vigor do mesmo e sempre que esta não atrase 
    indevidamente.[12] 
    25.     Portanto, ao 
    executar o Sr. Domingues, o peticionário afirma que os Estados Unidos 
    violariam o objeto e propósito da  Convenção sobre os Direitos da Criança e 
    a Declaração Americana e, portanto, constituiria uma quebra de suas 
    obrigações jurídicas internacionais. 
    B.       
    Posição do Estado 
    26.     Até a data do 
    presente relatório, a Comissão não recebeu nenhuma observação ou informação 
    do Estado em relação as denúncias do Sr. Domingues. 
     IV.     ANÁLISE 
    27.     Antes de iniciar a 
    análise do presente caso, a Comissão esclarece que, à luz das circunstâncias 
    excepcionais desta matéria como a pena de morte e do fato de que as partes 
    tiveram várias oportunidades de apresentar observações sobre a 
    admissibilidade e o mérito das reivindicações dos peticionários,  e de 
    conformidade com sua prática baseada em petições desta natureza,[13]  
    a Comissão decide considerar a admissibilidade das denúncias dos 
    peticionários conjuntamente com o mérito. 
    28.     A este respeito, e 
    na ausência de toda observação de parte do Estado sobre a admissibilidade ou 
    o mérito do caso do Sr. Domingues, a Comissão deseja destacar o  significado 
    das obrigações dos Estados membros da  OEA de responder as comunicações da  Comissão, 
    inclusive aquelas vinculadas a petições que denunciam violações de direitos 
    humanos atribuíveis a um Estado membro.  Esta obrigação deriva em geral 
    das responsabilidades dos Estados membros em matéria de direitos humanos 
    como partes da  Carta da  OEA e de outros instrumentos pertinentes, e 
    especificamente, dos disposto nos artigos 19 e 20 do Estatuto da  Comissão e 
    dos artigos 30 e 38 do Regulamento da  Comissão. 
    29.     Entre as 
    consequências que derivam do silêncio de um Estado sobre os méritos de uma 
    petição está o direito da Comissão, conforme o artigo 39 de seu Regulamento, 
    de presumir que os fatos alegados nessa petição são verdadeiros enquanto não 
    surjam outras provas que ensejem uma conclusão diferente.  Tendo em 
    consideração esta norma é que a Comissão avaliará as alegações do 
    peticionário no caso presente. 
    A.      
    Competência da  Comissão 
    30.     O peticionário 
    alega que o Estado violou os direitos do senhor Domingues consagrados no 
    artigo I (Direito à vida), artigo II (Direito à igualdade perante a lei), 
    artigo VII (Direito à proteção das crianças) e artigo XXVI (Direito a não 
    receber um castigo cruel), da  Declaração Americana dos Direitos e Deveres 
    do Homem.  O Estado é membro da  Organização dos Estados Americanos, 
    mas não é parte da  Convenção Americana sobre Direitos Humanos,  como 
    disposto no artigo 20 do Estatuto da  Comissão, e depositou seu instrumento 
    de ratificação da  Carta da  OEA em 19 de junho de 1951.[14]  
    Os fatos formulados na  denúncia do peticionário ocorreram depois da 
    ratificação da  Carta da  OEA pelo  Estado.  A suposta vítima é cidadão 
    natural e o peticionário foi autorizado conforme o artigo 23 do Regulamento 
    da  Comissão a interpor a petição em nome do Sr. Domingues.  Portanto, 
    a Comissão tem competência para examinar esta petição. 
    B.       
    Admissibilidade 
    31.     Com respeito à 
    admissibilidade das denúncias do Sr. Domingues, a informação apresentada 
    pelo peticionário indica que o Sr. Domingues interpôs uma petição perante o 
    Tribunal de Primeira Instância do Estado para corregir uma "sentença ilegal".  
    O Tribunal indeferiu a petição e o Sr. Domingues apelou perante a Suprema 
    Corte de Nevada, instância superior daquele estado.  Ao revisar o caso, 
    a Suprema Corte de Nevada examinou somente se a legislação de Nevada estava 
    submetida ao tratado internacional ratificado pelos Estados Unidos que 
    proibe a execução de pessoas menores de 18 anos quando cometeram delitos 
    puníveis com a pena capital.  A Corte concluiu que a reserva ao PIDCP 
    determinada pelo  Senado dos Estados Unidos, que visa outorgar  o 
    Estado o direito de executar a delinquentes juvenis apesar de não derrogar 
    os dispositivos do PIDCP, permitia a execução do Sr. Domingues.  A 
    Suprema Corte de Nevada, assim como o Tribunal de Primeira Instância, não 
    examinou se reserva era válida ou se execução de menores de 18 anos viola o 
     direito internacional consuetudinário ou jus cogens.  Dado que 
    o Tribunal de Primeira Instância e a Suprema Corte de Nevada não 
    manifestaram-se sobre o mérito, o peticionário argumenta que o Sr. Domingues 
    foi impedido de gozar do seu direito a interpor uma apelação substantiva. 
    32.     Conforme consta do 
    expediente, em 3 de março de 1999 o Sr. Domingues interpôs uma petição de 
    certiorari perante a Suprema Corte dos Estados Unidos alegando a 
    violação do PIDCP, o direito internacional consuetudinário e o  jus 
    cogens.  Em 1º de novembro de 1999 a Suprema Corte dos Estados 
    Unidos indeferiu a petição do Sr. Domingues sem examiná-la.  O Estado 
    não alegou nem indicou por outra via que o Sr. Domingues não esgotou os 
    recursos internos disponíveis nos Estados Unidos com respeito ao presente 
    caso. 
    33.     Com base na  informação 
    aportada no expediente, a Comissão conclui que a denúncia de violação dos 
    artigos I, II, VII e XXVI da Declaração Americana contidas na  petição do 
    peticionário de 20 de dezembro de 1999 não é admissível por não ter esgotado 
    os recursos internos, de conformidade com o artigo 31(1) do Regulamento da  Comissão.[15] 
    34      Além disso, 
    os antecedentes do caso indicam que a petição apresentada em nome do Sr. 
    Domingues em 1º de maio de 2000 e, portanto, dentro dos seis meses do 
    desprovimento do recurso de certiorari perante a Suprema Corte dos 
    Estados Unidos.  O Estado não contestou o prazo de apresentação da  petição 
    do Sr. Domingues.  Portanto, a Comissão não conclui que a petição do 
    peticionário seja inadmissível pela violação do prazo de seis meses previsto 
    no artigo 32 de seu Regulamento.[16] 
    35.     Não existem provas 
    nos autos que indiquem que a matéria da  denúncia do Sr. Domingues esteja 
    pendente de solução perante outra instância internacional, como disposto no 
    artigo 33(1)(a) do Regulamento da Comissão.[17]  
    Embora a Comissão tenha recebido duas petições neste caso, que 
    essencialmente duplicam a mesma matéria, o Sr. Domingues, obedecendo os 
    termos do artigo 33(2)(b) do Regulamento da  Comissão,[18]  
    autorizou ao Sr. Blaseky,  autor da  segunda petição, para representá-lo 
    no procedimento frente a Comissão consolidando as duas denúncias. O Estado 
    não alegou a duplicação de procedimentos, portanto, as denúncias do 
    peticionário são admissíveis de acordo com o artigo 33(1)(a) do Regulamento 
    da  Comissão. 
    36.     Após examinar as 
    observações das partes e demais material que consta do expediente, e à luz 
    do maior rigoroso escrutínio que a Comissão tradicionalmente vem aplicando 
    aos casos que envolvem a aplicação da  pena capital, a Comissão considera 
    que a petição dos peticionários não é manifestadamente infundada e contém 
    fatos que, se provados verdadeiros, tendem a configurar a violação dos 
    artigos I, II, VII e XXVI da  Declaração Americana.  Consequentemente, 
    a Comissão conclui que a petição do Sr. Domingues é  inadmissível de acordo 
    com o artigo 34 do Regulamento da  Comissão.[19] 
    37.     De acordo com a 
    análise exposta anteriormente, a Comissão decide declarar admissível a 
    petição com respeito  aos artigos I, II, VII e XXXVI da  Declaração 
    Americana, e proceder com o exame de mérito  destas questões. 
    C.      Mérito
    1.       
    Norma para o exame 
    38.     Antes de abordar 
    os mérito do presente caso, a Comissão reitera sua doutrina pacífica quanto 
    à aplicação de um escrutínio mais rigoroso na análise dos casos que envolvem 
    a pena capital.  O direito à vida é amplamente reconhecido como o 
    direito supremo do ser humano e conditio sine qua non para o gozo de 
    todos os demais direitos.  Portanto, a Comissão considera que tem uma 
    obrigação ainda maior de garantir que toda privação da  vida que o Estado 
    membro da  OEA pretende perpretar pela  via da  pena de morte cumpra 
    estritamente com os requisitos dos instrumentos de direitos humanos 
    interamericanos aplicáveis, incluindo a Declaração Americana. Este rigoroso 
    escrutínio” é compatível com o critério limitado adotado por outras 
    autoridades internacionais de direitos humanos para a imposição da  pena de 
    morte,[20] e foi articulado e 
    aplicado pela  Comissão em casos de pena capital que examinou em ocasiones 
    anteriores.[21] 
    39.     A Comissão observa 
    também que o maior escrutínio aplicável aos casos de pena de morte não 
    impede que a Comissão aplique a fórmula da  quarta instância.  Segundo 
    esta fórmula, a Comissão em princípio não pode examinar as sentenças dos 
    tribunais internos que atuaram dentro de sua competência e com as devidas 
    garantias judiciais.[22] 
    Entretanto,  nos casos que envolvem a possível violação dos direitos de uma 
    pessoa de acordo com os instrumentos de direitos humanos interamericanos 
    aplicáveis, a Comissão defende sistematicamente que não se aplica a fórmula 
    da quarta instância.[23]  
    A Comissão, portanto, examinará as alegações formuladas pelo  peticionário 
    com um maior rigor para garantir que o Estado respeitou devidamente os 
    direitos do Sr. Domingues consagrados na  Declaração Americana. 
    2.       
    Decisão da  Comissão em Roach e Pinkerton 
    40.     A Comissão 
    assinalou no início de sua análise que os argumentos do peticionário 
    refererem-se substancialmente à decisão da  Comissão de 1987 no caso Roach e 
    Pinkerton contra os Estados Unidos.[24]  
    Ese caso vinculava-se a dois delinquentes juvenis, James Terry Roach e Jay 
    Pinkerton, que foram sentenciados à morte, respectivamente, nos Estados de 
    Carolina do Sul e Texas, por delitos cometidos quando tinham 17 anos de 
    idade.  Ambos peticionários foram posteriormente executados por esses 
    Estados.  Ao analisar as denúncias apresentadas em nome do Sr. Roach e 
    Sr. Pinkerton, a Comissão examinou se, ao sentenciar os dois réus à morte e 
    permitir posteriormente sua execução, os Estados Unidos estariam atuando em 
    violação de uma norma reconhecida do direito internacional jus cogens 
    ou consuetudinário.  A Comissão manifestou-se, de forma específica, nos 
    seguintes termos: 
    A Comissão considera que os Estados membros da  OEA 
    reconhecem uma norma de jus  cogens que proibe a execução de 
    crianças menores de idade.  Tal norma é aceita por todos os Estados do 
    Sistema Interamericano, incluindo os Estados Unidos. […]   A 
    Comissão considera que este caso surge não porque haja dúvida da  existência 
    de uma norma internacional sobre a proibição da  imposição da  pena de morte 
    para crianças menores de idade, mas porque os Estados Unidos refutam as 
    alegações de que existe um  consenso sobre a idade para a maioridade.[25] 
    41.     A Comissão em 
    última instância concluiu que não existia nesse momento uma norma jus 
    cogens ou outra norma do direito internacional consuetudinário que 
    proibisse  a execução de menores de 18 anos: 
    A Comissão aceita o argumento dos Estados Unidos de que não 
    existe neste momento uma norma consuetudinária em direito internacional que 
    estabeeça a idade de 18  anos como idade mínima para a imposição da  pena 
    de morte. Contudo, a Comissão observa que esta norma está emergendo, em 
     vista do número crescente de países que ratificaram a Convenção Americana e 
    o  Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas, e 
    que devido a isto modificaram a sua legislação interna para adaptá-la a 
    estes instrumentos. Como  mencionado anteriormente, treze estados dos 
    Estados da Unidos e a Capital Federal, já aboliram a pena de morte de forma 
    absoluta e nove dos estados que ainda mantêm tal pena,[26] 
    a aboliram para  delinquentes menores de 18 anos de idade.[27] 
    42.     Por conseguinte, 
    ao decidir sobre a presente denúncia, a Comissão deve determinar se o estado 
    de direito internacional com relação à execução de menores de 18 anos 
    progrediu desde que adotou a sua decisão em Roach e Pinkerton. 
    3.       A 
    Declaração Americana, o direito internacional consuetudinário e as normas 
    jus cogens        
    43.     Ao analisar as 
    denúncias apresentadas pelo peticionário em relação ao  presente estado das 
    normas que regem a execução de menores em virtude do direito internacional, 
    é necessário primeiramente realizar um exame geral das categorias de normas 
    do direito internacional pertinentes a esta análise, a saber, o direito 
    internacional consuetudinário e as normas de jus cogens, bem como os 
    meios principais pelos quais se manifesta o conteúdo destas normas. 
    44.     A este respeito, a 
    Comissão recorda que, ao interpretar e aplicar os artigos I, VII e XXVI da 
    Declaração ao presente caso, estes devem ser considerados no contexto dos 
    sistemas internacional e interamericano de direitos humanos no sentido mais 
    amplo, à luz da  evolução do direito internacional em matéria de direitos 
    humanos desde que foram  redatados.[28]  
    A este respeito, deve prestar-se a devida atenção as demais normas 
    pertinentes de direito internacional aplicáveis aos Estados membros contra 
    os quais foram apresentadas denúncias de violação da  Declaração[29]  
    bem como a evolução do corpus juris gentium do direito internacional 
    em matéria de direitos humanos ao longo do tempo e nas condições atuais.[30] 
    45.     A evolução do 
    corpo de direito internacional em matéria de direitos humanos relevante à 
    interpretação e aplicação da  Declaração Americana pode, por sua vez, 
    derivar-se de distintas fontes de direito internacional,[31] 
    incluindo as disposições de outros instrumentos internacionais e regionais 
    de direitos humanos[32] e o 
    direito internacional consuetudinário,[33]  
    incluindo as normas consuetudinárias que formam parte do jus cogens.[34]
     
    46.     Com respeito as 
    normas de direito internacional consuetudinário em especial, embora as 
    mesmas tenham um caráter intrinsecamente volúvel e, portanto, não podem ser 
    objeto de enumeração definitiva ou exaustiva, existe, porém um amplo 
    consenso a respeito dos elementos necessários para estabelecer uma norma de 
    direito internacional consuetudinário. Os elementos são os seguintes: 
    a.          
    uma prática concordante por uma série de Estados com referência ao tipo de 
    situação compreendida dentro do domínio das relações internacionais; 
    b.         
    uma continuidade ou reiteração da  prática ao longo de um período 
    considerável; 
    c.        a 
    concepção de que a prática está exigida pelo direito internacional imperante 
    ou é compatível com este; 
    d.         
    a aquiescência geral na  prática de outros Estados.[35] 
    47.     Estes elementos, 
    por sua vez, sugerem que, quando se considera o estabelecimento desta norma 
    consuetudinária, deve-se prestar atenção à evidência da  prática pelo  Estado.[36]  
    Embora o valor das possíveis fontes de evidência varia de acordo com as 
    circunstâncias, a prática dos Estados é em geral  interpretada no sentido de 
    que constitua um comportamento governamental oficial que incluiria a 
    legislação do Estado, as decisões judiciais internacionais e nacionais, 
    relações de tratados e outros instrumentos internacionais, um padrão de 
    tratados na mesma forma, a prática de organizações governamentais 
    internacionais e regionais tais como as Nações Unidas e a Organização dos 
    Estados Americanos e seus órgãos, declarações de política nacional, 
    comunicados de imprensa e manuais oficiais sobre questões jurídicas.[37]  
    Em suma, a prática do Estado em geral compreende todo ato ou declaração do 
    Estado dos quais se pode inferir opiniões sobre o direito consuetudinário.[38]
     
    48.     Uma vez 
    estabelecida, a norma de direito internacional consuetudinário obriga a 
    todos os Estados com exceção unicamente daqueles que rejeitaram 
    sistematicamente a prática antes que de esta transformar-se em lei.  
    Embora certas práticas não exigem aceitação universal para transformarem-se  
    em normas de direito internacional consuetudinário, a norma que foi aceita 
    pela  maioria dos Estados não tem efeito obrigatório para o Estado que 
    sistematicamente rejeitou a prática em que essa norma baseia-se.[39]
     
    49.     Com relação as 
    normas que regem o estabelecimento do jus cogens, esta Comissão 
    definiu previamente o conceito de jus cogens no sentido de que deriva 
    de conceitos jurídicos antigos de "uma ordem superior de normas jurídicas 
    que as leis do homem ou as nações não podem contravenir" e como "normas que 
    foram aceitas, seja expressamente por tratados ou tacitamente pelo costume, 
    como necessárias para proteger a moral pública  reconocidas por elas".[40]  
    A principal característica distintiva destas normas é sua "relativa 
    obrigatoridade", por constituir normas de direito consuetudinário 
    internacional que não podem ser deixadas de lado por tratados ou 
    aquiescência, mas sim pela  formação de uma posterior norma consuetudinária 
    de efeito contrário.[41]  
    Mais particularmente, dado que o direito internacional consuetudinário 
    descansa no consentimento das nações, o Estado que insistentemente 
    controverte uma norma de direito internacional consuetudinário não está 
    obrigado pela  mesma.  As normas de jus cogens, por sua parte, 
    derivam da sua condição de valores fundamentais defendidos pela  comunidade 
    internacional, na medida em que a violação dessas normas prioritárias chocam 
    a consciência da humanidade e, portanto, obrigam a comunidade internacional 
    como um todo, independentemente da  protesto, o reconhecimento ou a 
    aquiescência.[42] Os exemplos 
    geralmente citados como normas de direito consuetudinário que adquiriram 
    condição de normas jus cogens incluem o genocídio, a escravidão, o 
    desaparecimento forçado e a tortura ou outros tratamentos e castigos cruéis, 
    desumanos ou degradantes.[43]  
    Tem-se sugerido que o ponto de partida para identificar essas  
    identificação essas disposições jurídicas internacionais que alcançaram a 
    condição de jus cogens é a lista de direitos que os tratados 
    internacionais de direitos humanos tornam inalienáveis.[44] 
    50.     Por tanto, ainda 
    que baseado nas mesmas fontes probatórias que as normas de direito 
    internacional consuetudinário, o padrão para determinar um principio de 
    jus cogens é mais rigoroso e requer evidências de reconhecimento do 
    carácter obrigatório da  norma por parte da  comunidade internacional em seu 
    conjunto. Isto pode ocorrer onde há aceitação e o  reconhecimento para uma 
    maioria grande de Estados, ainda que um número pequeno de Estados discordem.[45]        
     
    4.       
    Estatuto jurídico internacional sobre  execução de menores 
    51.     O artigo I da  Declaração 
    dispõe que "todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança de 
    sua pessoa." 
    52.     A Comissão observa 
    que, embora o artigo I da  Declaração Americana não se refere explicitamente 
    à questão da  pena capital, em decisões anteriores declinou de interpretar o 
    artigo I da  Declaração no sentido de que proibe o uso da  pena de morte 
    per se nem de que excetua a pena capital de todas as normas e proteções 
    da  Declaração.  Pelo  contrário, em parte devido aos antecedentes 
    legislativos da  Declaração Americana, bem como os termos do  artigo 4 da  Convenção 
    Americana sobre Direitos Humanos, a Comissão chegou a conclusão de que o 
    artigo I da  Declaração, embora não proiba absolutamente a pena de morte, 
    proibe a sua aplicação quando isto dê lugar a uma privação arbitrária da  vida 
    ou a torne um castigo cruel, degradante ou por outras razões.[46] 
    53.     Como assinalado 
    anteriormente, o peticionário argumenta que, conforme a  evolução do direito 
    internacional desde 1986, existe agora uma norma de direito internacional 
    consuetudinário que impede a execução de menores que tinham de 16 ou 17 anos 
    no momento em que cometeram o delito.  O peticionário alega que esta 
    norma adquiriu a condição de jus cogens, 
    [47]e ,  consequentemente, 
    pede a decisão da  Comissão no Caso Roach e Pinkerton seja revisada e 
    ampliada a fim de determinar  que o artigo I da  Declaração proibe a 
    execução do Sr. Domingues como delinquente juvenil, o qual tinha 18 anos 
    quando cometeu o delito. 
    54.     Ao abordar esta 
    questão, a Comissão deve, portanto, avaliar se as disposições da  Declaração 
    Americana, interpretadas no contexto da  evolução do direito internacional 
    consuetudinário e das normas de jus cogens, proibe a execução de 
    pessoas que, ao cometer o delito, tinham menos de 18 anos.  Para isto, 
    é necessário que a Comissão tenha em conta as evidências da  prática 
    relevante do Estado de acordo com distintas fontes, incluindo as relações 
    nos tratados e outros instrumentos internacionais, o padrão de tratados na 
    mesma forma, a prática das Nações Unidas e de outras organizações 
    governamentais internacionais e a legislação interna e as decisões judiciais 
    dos Estados. 
    a.       
    Tratados 
    55.     Desde 1987 
    ocorreram vários fatos notáveis em relação aos tratados que explicitamente 
    proibem a execução de pessoas menores de 18 anos de idade no momento em que 
    cometeram o delito.  Esta evolução inclui a entrada em vigor de novos 
    acordos internacionais bem como a maior ratificação dos tratados existentes. 
    56.     O que é mais 
    importante, em 20 de novembro de 1989 a Assembléia Geral da  ONU aprovou a 
    Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança.  O artigo 
    37(a) da  Convenção estabelece que: 
    Os Estados partes velarão para que:  a) 
    Nenhuma criança seja submetida a torturas nem a outros tratamentos ou penas 
    cruéis, desumanos ou degradantes.  Não será imposta a pena capital nem 
    a de prisão perpétua sem a possibilidade de liberdade por delitos cometidos 
    por menores de 18 anos de idade. 
    57.     O tratado entrou 
    em vigor em 2 de setembro de 1990 e em setembro de 2001 a Convenção incluia 
    191 Estados partes sem reservas explicitas ao artigo 37(a).[48]  
    Os Estados Unidos assinaram a Convenção em fevereiro de 1995 mas não a 
    ratificaram, sendo que juntamente com a Somália são os únicos dois países 
    que não são partes do tratado.  Na opinião da  Comissão, a amplitude da 
     ratificação deste instrumento , por si só, constitui uma prova eloquente do 
    amplo consenso de parte da comunidade internacional ao repúdio contra a 
    execução de delinquentes juvenis. 
    58.     O Pacto 
    Internacional de Direitos Civis e Políticos (PICDP) foi aprovado pela  Assembléia 
    Geral da  ONU em 1966 e entrou em vigência em 1976.  Atualmente conta 
    com 64 signatários e 147 partes.[49]  
    Desde 1986, 64 países aderiram e ratificaram o Pacto,[50]  
    incluindo os Estados Unidos em 1992.[51]  
    O artigo 6(5) do PIDCP, assim como o artigo 37(a) da  Convenção sobre os 
    Direitos da Criança, dispõe que: 
    Não será imposta a pena de 
    morte por delitos cometidos por pessoas de menos de 18 anos de idade, nem 
    será aplicada contra as mulheres grávidas.          
    59.     Dos países partes desta Convenção, somente os 
    instrumentos de ratificação dos Estados Unidos e o instrumento de adesão de 
    Tailândia estiveram acompanhados de declarações ou reservas a respeito do 
    artigo 6(5). A Tailândia apresentou declarações interpretativas do artigo 
    6(5) nos seguintes  termos : 
    Com respeito ao artigo 6, parágrafo 5 do Pacto, 
    o Código Penal Tailandês determina aos tribunais ou outorga em alguns casos 
    grande latitude aos tribunais, para ter em conta a idade do  delinquente 
    como fator atenuante na  formulação da  sentença.  Enquanto a Seção 74 
    do Código não permite nenhum tipo de castigo contra uma pessoa menor de 14 
    anos de idade, a Seção 75 do mesmo Código estabelece que toda vez que uma 
    pessoa maior de 14 anos mas  menor de 17 comete um ato considerado delito 
    pela  lei, o tribunal terá em conta o sentido de responsabilidade e todos os 
    demais aspectos pertinentes a fim de chegar a uma decisão sobre se é 
    apropriado pronunciar uma sentença que infringe um castigo.  Se o 
    tribunal não considera apropriado pronunciar uma sentença de castigo, 
    procederá de acordo com a Seção 74 (a saber, adotar outras medidas 
    correctivas distintas do castigo) ou, se a Corte considera apropriado 
    pronunciar uma sentença de castigo, reduzirá a escala do mesmo à metade.  
    A Seção 76 do mesmo Código também estabelece que, toda vez que uma pessoa 
    maior de 17 anos mas  menor de 20 comete algum ato considerado delito pela 
     lei, o tribunal pode, se  o considera adequado, reduzir a escala de 
    castigo previsto para esse delito em um terço ou a metade.  A redução 
    desta escala  impedirá o tribunal pronunciar uma sentença de morte.  
    Por esta razão, ainda que em  teoria pode impor-se a sentença de morte por 
    delitos cometidos por pessoas menores de 18 anos mas não menores de 17, o 
    tribunal sempre exerce a discricionariedade outorgada pela Seção 75 para 
    reduzir estas escala de castigo, e na  prática não impôs a pena de morte a 
    nenhuma pessoa menor de 18 anos de idade.  Consequentemente, a 
    Tailândia considera que em termos reais já deu cumprimento aos princípios 
    consagrados neste dispositivo. 
    60.     O efeito da 
    declaração da Tailândia é esclarecer que, apesar dos termos estritos de sua 
    legislação, na  prática não executa delinquentes juvenis e, portanto, na 
    realidade já deu cumprimento ao  artigo 6(5) do PIDCP. 
    61.     Por sua parte, os 
    Estados Unidos apresentaram a seguinte  reserva ao artigo 6(5) do PIDCP. 
    Que os Estados Unidos reservam-se o direito, 
    sujeito a suas restrições constitucionais, a impor a pena capital a toda 
    pessoa (exceto uma mulher grávida) devidamente condenada de acordo com a 
    legislação vigente ou futura que permita a imposição da  pena capital, 
    incluindo os castigos por delitos cometidos por pessoas menores de 18 anos 
    de idade. 
    62.     Cabe ressaltar que 
    esta reserva provocou a condenação dentro da  comunidade internacional e fez 
    com que oito países europeus apresentassem objeções declarando que a reserva 
    era inválida porque  incompatível com os objetivos e propósitos do PIDCP, 
    segundo o disposto na  Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados.[52]  
    Ademais, em 1995, o Comitê de Direitos Humanos da  ONU declarou que esta 
    reserva era contrária ao objeto e propósito do PIDCP e recomendou aos 
    Estados Unidos que a retirasse.[53] 
    63.     Outros tratados 
    internacionais e regionais de direitos humanos que regulam a implementação 
    da  pena de morte atestaram de maneira análoga um incremento nos Estados 
    partes dos mesmos desde 1987.  Com respeito ao sistema interamericano 
    de direitos humanos em especial, o artigo 4 da  Convenção Americana sobre 
    Direitos Humanos dispõe que 
    
    Não será imposta a pena de 
    morte a pessoas que, no momento em que cometeram o delito, tinham menos de 
    dezoito anos de idade  
    64.     Atualmente 24 
    Estados são partes da Convenção Americana.[54]  
    Desde 1986, os seguintes cinco Estados membros da  OEA ratificaram ou 
    aderiram a Convenção, sem que nenhum deles apresentasse reservas a respeito 
    da  proibição estabelecida no artigo 4(5) sobre a execução de delinquentes 
    juvenis:  Brasil (1992), Chile (1990), Dominica (1993), Suriname 
    (1987), Trinidad e Tobago (1991, que posteriormente denunciou a Convenção em 
    1998). Os  Estados Unidos assinaram Convenção Americana em 1977 mas 
    nunca a ratificou.  A Comissão considera que esta ampla adesão 
    hemisférica à Convenção Americana, incluindo seu artigo 4(5), constitui 
    prova eloquente de uma norma regional que repudia a aplicação da  pena de 
    morte a menores de 18 anos, inclusive entre Estados tais como Guatemala, 
    Jamaica e Grenada que, assim como os Estados Unidos, mantêm a pena de morte. 
    65.     Esta evolução 
    internacional e regional foi acompanhada de iniciativas nos sistemas 
    interamericano e  europeu para proibir absolutamente a aplicação da  pena de 
    morte.  Em 1990, por exemplo, o Protocolo da  Convenção Americana sobre 
    Direitos Humanos para Abolir a Pena de Morte foi aprovado pela Assembléia 
    Geral da  OEA no vigésimo período ordinário de sessões celebrado em Assunção, 
    Paraguai.  Desde então, oito Estados assinaram e ratificaram o 
    Protocolo.  Da mesma forma, o Protocolo N° 6 da  Convenção Européia 
    sobre Direitos Humanos em relação à abolição da pena de morte derroga a pena 
    de morte totalmente, com exceção dos tempos de guerra.  O Protocolo 
    entrou em vigência em março de 1985 e atualmente está ratificado por 39 
    Estados europeus.  Estes Estados assinaram mas não ratificaram o 
    Protocolo e somente Turquía permanece como Estado membro do Conselho da 
    Europa que ainda não assinou esse Protocolo. 
    66.     Na opinião da 
    Comissão, esta evolução do corpo de direito internacional em  matéria de 
    direitos humanos deve ser considerada também à luz das disposições 
    correspondentes na  esfera do direito internacional humanitário.[55]  
    A este respeito, o Quarto Convênio de Genebra de 1949 proibe a imposição da 
     pena de morte a delinquentes juvenis em tempos de conflicto armado ou 
    ocupação.[56]  O artigo 
    68, parágrafo 4 do Quarto Convênio de Genebra, que rege a aplicação da  pena 
    de morte a pessoas protegidas em situações de ocupação, dispõe em parte que 
    Em todo caso, não será possível impor a pena 
    de morte contra uma pessoa protegida que  tinha 18 anos de idade no 
    momento em que cometeu o delito.  
    67.     Em 1º de janeiro 
    de 1986, 162 Estados eram partes do Quarto Convênio de Genebra e, em 2001, o 
    número de Estados partes havia aumentado para 189.[57] 
    Isto inclui os Estados Unidos, que ratificaram a Convenção em 2 de agosto de 
    1955 sem apresetar reserva alguma ao parágrafo 4 do artigo 68.  A este 
    respeito, a Comissão não pode identificar nenhuma justificativa apropriada 
    para aplicar uma norma mais restritiva à aplicação da  pena de morte a 
    menores em tempos de ocupação que em tempos de paz, estando esta proteção, 
    como o está, relacionada com as proteções mais básicas não derrogáveis da  vida 
    humana e a dignidade dos adolescentes, que são comuns a ambos regimes do 
    direito internacional.  Como observou o Comitê Internacional da Cruz 
    Vermelha em seu Comentário ao artigo 68, parágrafo 4 do Quarto Convênio de 
    Genebra: 
    A cláusula corresponde a disposições similares do código 
    penal de muitos países, e baseia-se na  idéia de que uma pessoa que não 
    completeu  18 anos não é plenamente capaz de um julgamento ponderado, nem 
    sempre tem consciência do significado de seus atos e com frequência atua 
    baixo a influência de outros, e as vezes baixo coação.[58] 
    68.     Portanto, a 
    análise anterior  indica que desde 1987, de forma compatível com a evolução 
    anterior essa data, foi registrada uma ampla e consistente evolução e 
    ratificação dos tratados, em que praticamente todos os países reconheceram 
    sem reservas uma norma que proibe a execução de menores de 18 anos no 
    momento em que cometeram o delito. 
    b.       
    Resoluções e normas das Nações Unidas 
    69.     A evolução do 
    direito dos tratados examinada anteriormente tem sido acompanhada de 
    iniciativas e práticas similares de parte dos órgãos das Nações Unidas.  
    Antes da decisão da  Comissão em Roach e Pinkerton, a Terceira Comissão da  Assembléia 
     Geral das Nações, em 1980, ja havia reconhecido que o artigo 6 do PIDCP 
    constituía uma "norma mínima" para todos os Estados membros da  ONU e não 
    somente para os que haviam  ratificado esse instrumento.[59]  
    De acordo com esta posição, em 24 de agosto de 1999,  Subcomissão das Nações 
    Unidas sobre a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos aprovou uma 
    resolução que condenava a imposição da  pena de morte àqueles que tivessem  
    18 anos no momento de cometer o delito e exortava os países que continuavam 
    executando  menores a que pussessem um fim a esta prática.[60]  
    Ademais, no 54° Período Ordinário de Sessões da  Comissão de Direitos 
    Humanos da  ONU foi aprovada outra resolução que instava os Estados que 
    mantinham a pena de morte a dar cumprimento ao Pacto Internacional não 
    impondo a pena de morte por delitos cometidos por pessoas menores de 18 anos 
    de idade.[61] 
    70.     O Conselho 
    Econômico e Social das Nações Unidas também aprovou algums normas proibindo 
    a execução de menores de 18 anos quando cometeram o delito.[62]  
    Essas mesmas normas foram aprovadas pela  Assembléia Geral e pelo  Sétimo 
    Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Delito e o Tratamento do 
    Delinquente.[63]  As 
    Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração de Justiça a Jovens 
    proibe de forma análoga a execução de delinquentes juvenis.[64] 
    71.     Sendo assim, é 
    evidente que os órgãos das Nações Unidas responsáveis pelos direitos humanos 
    e a justiça penal respaldaram sistematicamente a norma inserida nos acordos 
    internacionais de direitos humanos que proibem a  execução de delinquentes 
    menores de 18 anos. 
    c.       
    Prática interna dos Estados 
    72.     A articulação de 
    uma norma internacional que proscreve a execução de delinquentes juvenis 
    através da  prática internacional vem sendo acompanhada pela  expressão de 
    uma norma similar na  prática interna dos Estados.  Em 1986, 46 países 
    haviam  abolido a pena de morte por delitos tradicionais, com exceção de 
    certos delitos da lei militar ou em tempos de guerra.  De acordo com as 
    estatísticas disponíveis, o número aumentou em muito, sendo que 49 países 
    aboliram a pena de morte por todo delito, menos os excepcionais, durante os 
    últimos 15 anos.  Ademais, outros 20 países não levaram a cabo nenhuma 
    execução durante 10 anos ou mais.  A taxa média anual de países que 
    aboliram a pena de morte aumentou de  1,5 (1965-1988) a 4 por ano 
    (1989-1995), ou seja, quase três vezes mais.[65]  
    De acordo com as estatísticas compiladas pela Anistia Internacional, uma 
    fonte reconhecida de investigação e informação em relação à aplicação 
    mundial da  pena de morte, 109 países aboliram este castigo por lei ou na  prática 
    até o ano 2001.[66] 
    73.     Novamente de 
    acordo com as estatísticas compiladas pela Anistia Internacional, 115 
    Estados cuja legislação mantém a pena de morte por alguns delitos incluem 
    disposições em sua legislação que excluem o uso da  pena de morte contra 
    delinquentes menores ou pode presumir-se que excluem esta aplicação porque 
    passaram a ser partes do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, 
    da  Convenção sobre os Direitos da Criança ou da  Convenção Americana sobre 
    Direitos Humanos sem apresentar reservas aos artigos pertinentes desses 
    instrumentos.[67]  Desde 
     o início de 1994, pelo menos cinco países modificaram sua legislação para 
    eliminar a aplicação da  pena  de morte contra delinquentes juvenis: 
    Barbados, Paquistão, Iêmen, Zimbábue e China.[68] 
    74.     Uma minoria muito 
    pequena de Estados continua aplicando a pena de morte a delinquentes juvenis.  
    Desde 1960, tem-se conhecimento que sete países executaram  reclusos  
    que eram menores de 18 anos no momento em que cometeram o delito –Congo (República 
    Democrática do Congo), Irã, Nigéria, Paquistão, Arábia Saudita, Estados 
    Unidos e Iêmen.[69]  Um 
    estudo das execuções de delinquentes juvenis no mundo cita um total de 25 
    num período de 10 anos.  Quatorze destas execuções foram levadas a cabo 
    nos Estados Unidos da América, seis no  Irã e as restantes cinco nações 
    levaram a cabo uma execução cada uma.  Paquistão e Iêmen aboliram a 
    pena de morte para os delinquentes juvenis menores de 16 e 17 anos.[70]  
    No ano 2000, somente três países executaram menores de 18 anos: os Estados 
    Unidos, a República Democrática do Congo e Irã.  Em 1999 foram 
    realizadas execuções de menores somente no Irã e nos Estados Unidos.  
    Em 1998 os Estados Unidos foram o único a executar três delinquentes juvenis. 
    A única execução que levou a cabo o Iêmen corresponde a 1993 e a Arábia 
    Saudita em 1992, de modo que, desde 1998,  soemtne três Estados - os 
    Estados Unidos, Congo e Irã -  haviam executado a delinquentes juvenis 
    sentenciados à morte.[71] 
    75.     Assim como no caso 
    da  adesão a tratados regionais no hemisfério ocidental, cabe ressaltar que, 
    dos poucos Estados que continuam executando delinquentes juvenis, nenhum 
    deles, com exceção dos Estados Unidos, estão entre os membros do sistema 
    interamericano.  Na opinião da Comissão, isto reforça a existência de uma 
    norma regional particularmente extendida que repudia la aplicação da  pena 
    de morte a pessoas menores de 18 anos de idade.   
    76.     A prática interna 
    nos últimos 15 anos, portanto, evidencia uma tendência internacional quase 
    unânime e não qualificada em direção à proibição da execução de delinquentes 
    menores de 18 anos.  Esta tendência abarca todos os aspectos políticos 
    e ideológicos e praticamente isolou os Estados Unidos como o único país que 
    continua mantendo a legalidade da  execução de delinquentes de 16 e 17 anos, 
    embora como indicado mais adiante este exista somente em algumas das 
    jurisdições internas. 
    d.       
    Prática  interna dos Estados Unidos 
    77.     Dentro dos Estados 
    Unidos, as decisões judiciais e as iniciativas legislativas dos últimos 20 
    anos  também demonstraram uma tendência a não aceitar a aplicação da  pena 
    de morte a delinquentes menores de 18 anos.  Na  época da  decisão da  Suprema 
    Corte de Estados Unidos no caso Thompson contra Oklahoma, em 1988, 37 
    estados autorizavam a aplicação da  pena capital e desses, 18 exigiam que o 
    acusado tivesse cumprido pelo  menos  16 anos no momento em que 
    cometeram o delito, enquanto os 19 restantes não estabeleciam uma idade 
    mínima para a imposição da  pena de morte.[72]   
    Na  decisão de Thompson, a Suprema Corte de Estados Unidos entendeu que a 
    execução de delinquentes menores  de 16 anos no momento de cometer o 
    delito estava proibida pela  Oitava Emenda da  Constituição dos Estados 
    Unidos.[73]  Em sua 
    análise, a Suprema Corte concluiu que seria uma ofensa para as normas 
    civilizadas de decência executar uma pessoa menor de 16 anos no momento em 
    que cometeram o delito e citava, a fim de fundamentar a sua argumentação, o 
    fato de que  
    estatutos pertinentes do Estado –particularmente os dos 18 
    Estados que expressamente consideraram a questão de estabelecer uma idade 
    mínima para impor a pena de morte e exigiram uniformemente que o acusado 
    haja cumprido a idade de 16 anos no momento de cometer o delito punível com 
    pena capital- respaldam a conclusão de que ofenderia as normas civilizadas 
    de decência executar uma pessoa que seja menor de 16 anos no momento em que 
    cometeu o delito.  Essa conclusão também é compatível com as opiniões 
    expressadas por organizações professionais respeitáveis, por outras nações 
    que compartem herança angloamericana e por membros reconhecidos da  comunidade 
    de Europa Ocidental.[74] 78.     
    Desde o advento desta iniciativa da Suprema Corte dos Estados Unidos de 
    estabelecer a idade mínima de 16 anos para poder executar a um delinquente 
    nos Estados Unidos, outras jurisdições estaduais avançaram em direção de uma 
    norma mais estrita.  Em 1999, por exemplo, a Suprema Corte da Flórida 
    interpretou sua Constituição no sentido de proibir a pena de morte contra 
    delinquentes menores de 16 anos, determinando que a execução de uma pessoa 
    que tivesse 16 anos no momento de cometer o delito violava a Constituição da 
    Flórida e sua proibição de um castigo cruel.[75]  
    Em 30 de abril de 1999, mediante uma revisão da  lei do Estado de Montana, 
    foi elevada a idade mínima dos delinquentes qualificados para sofrer a pena 
    de morte de 16 para 18 anos. 
    79.     Atualmente, dentro 
    dos Estados Unidos, 38 Estados e as jurisdições militares e civis federais 
    contam com disposições que autorizam a pena de morte por delitos puníveis 
    com  a pena capital.  Destas jurisdições, 16 adotaram expressamente a 
    idade de 18 anos no momento de cometer o delito como a idade mínima para 
    poder aplicar a sentença de morte,[76]   
    em comparação com aproximadamente 10 em 1986,[77]  
    e 23 Estados utilizam idades abaixo de 18 anos, em comparação com 27 em 
    1986.[78]   Estas 
    estatísticas complementam o movimento internacional em direção a um 
    estabelecimento dos 18 anos como idade mínima para impor-se a pena capital.  
    A Comissão considera significativo que o próprio  governo federal dos 
    Estados Unidos tenha considerado os 18 anos como a idade mínima a fim de 
    sancionar delitos federais puníveis com a pena capital.[79]  
    Como autoridade responsável de fazer cumprir as obrigações do Estado 
    derivadas da Declaração Americana e de outros instrumentos internacionais, o 
    fato de que o governo dos Estados Unidos tenha adotado a idade de 18 anos 
    como norma pertinente, mereceu particular consideração de parte da  Comissão 
    e desta análise. 
    e.       
    Evolução paralela em matéria de maioridade  
    80.     A Comissão observa 
    que o surgimento dos 18 anos como idade mínima para a execução de 
    delinquentes é compatível com a evolução em outra esfera do direito 
    internacional que se refere à maioridade para a imposição de obrigações e 
    responsabilidades sérias e potencialmente fatais.  A Comissão observa 
    em particular o establecimento dos 18 anos como idade mínima para que as 
    pessoas participem diretamente em hostilidades como integrantes das Forças 
    Armadas de seus Estados.  A este respeito, o artigo 1 do Protocolo 
    Opcional à Convenção sobre os Direitos da Criança, em relação à participação 
    de menores em conflitos armados, aprovado e aberto à assinaturas, 
    ratificação e adesão em 25 de maio de 2000,[80]  
    dispõe sobre esse limite e reforça o conceito de que a idade de 18 anos 
    representa um umbral por debaixo do qual se requer proteção  especial: 
    Artigo 1 
    O  Estados partes adotarão todas as medidas a 
    seu alcance para assegurar que os integrantes de suas Forças Armadas que não 
    completaram a idade de 18 anos não participem diretamente nos confiltos 
    armados. 
    81.     Os Estados Unidos 
    assinaram o Protocolo Opcional em 7 de setembro de 2000, e, embora ainda não 
    o tenha ratificado nem a própria Convenção, o Presidente de Estados Unidos[81] 
    e o Congresso dos Estados Unidos manifestaram respaldo à norma prescrita no 
    artigo I, e o Congresso exortou a delegação norte-americana a não dificultar 
    a redação de um protocolo opcional à Convenção sobre os Direitos da Criança 
    que estabelece a idade de 18 anos como  a mínima para participar em 
    conflictos armados.[82] 
    82.     O Presidente dos 
    Estados Unidos também manifestou apoio a esta norma na  Assembléia Geral da 
     OEA a qual, por resolução de 5 de junho de 2000, assinalou que mais de 
    300.000 menores de 18 anos participam atualmente em conflitos armados em 
    distintas partes do mundo.  Tendo em consideração a estatística, a 
    Assembléia Geral instou os Estados membros a considerar a firme ratificação 
    do Protocolo Opcional à Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da 
    Criança em relação à participação de crianças em conflitos armados.[83]  
    Normas análogas foram reconhecidas internacionalmente e dentro dos próprios 
    Estados Unidos nas áreas de participação social como o direito ao voto, para 
    o qual se considera requisito mínimo, prévio e necessário ter-se cumprido 18 
    anos.[84] 
    83.     Sendo assim, a 
    conclusão de que surgiu uma norma internacional que estabelece os 18 anos 
    como a idade mínima para que uma pessoa possa merecer o castigo final da  morte 
    é, na opinião da Comissão, totalmente compatível com a evolução das  obrigações 
    de caráter equivalente ou menor, como a participação em conflitos armados ou 
    a eleição de dirigentes políticos.  Com efeito, é difícil pensar, e 
    muito menos justificar, por quê deve aplicar-se uma norma menos rigorosa à 
    implementação da  pena capital, tendo em vista as obrigações particulares 
    dos Estados de garantir o bem-estar dos delinquentes juvenis e empenhar-se 
    em sua reabilitação, como refletido no artigo 19 da  Convenção sobre 
    Direitos Humanos[85] e o artigo 
    VII da  Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem.[86] 
    Conforme entendeu recentemente a Corte Interamericana de Direitos Humanos, 
    quando o aparato do Estado tem que intervir em delitos cometidos por menores, 
    deve realizar um esforço substancial para garantir sua reabilitação a fim de 
    permitir-lhe cumprir um papel construtivo e produtivo na  sociedade.[87] 
     
             
    f.       Conclusão 
    84.     Na opinão da 
    Comissão, as evidências descritas anteriormente ilustram claramente que, ao 
    persistir na  prática de executar a delinquentes menores de 18 anos, os 
    Estados Unidos destacaram-se dentre outras nações desenvolvidas e no sistema 
    interamericano, e ficaram cada vez mais isolados da comunidade internacional.  
    As provas abundantes da prática dos Estados acima mencionada ilustra a 
    congruência e generalização entre os países no sentido de que a comunidade 
    internacional considera a execução de delinquentes menores de 18 anos no 
    momento em que cometeram o delito  incompatível com as normas imperantes de 
    decência.  Portanto, a Comissão opina que existe uma norma de direito 
    internacional consuetudinário que proibe a execução de delinquentes menores 
    de 18 anos no momento de cometer o delito. 
    85.     Com base na 
    informação disponível, a Comissão comprovou que esta norma tem sido 
    reconhecida como uma norma de caráter suficientemente inalienável necessária 
    para constituir uma norma de jus cogens, evolução prevista pela  Comissão 
    em sua decisão no caso Roach e Pinkerton.  Como assinalado 
    anteriormente, quase todos os Estados nações rejeitaram a imposição da  pena 
    capital a pessoas menores de 18 anos, em sua forma mais explícita, através 
    da  ratificação do PIDCP, a Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança e 
    a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, tratados que consideram esta 
    disposiçaõ não derrogável.  A aceitação desta norma engloba as 
    fronteiras políticas e ideológicas e os esforços por separar-se da mesma 
    forma energicamente condenados pelos integrantes da  comunidade 
    internacional como não permissíveis segundo as normas contemporâneas de 
    direitos humanos.  Com efeito, poderia-se afirmar que os próprios 
    Estados Unidos reconheceram o significado desta norma ao prescrever a idade 
    de 18 anos como norma federal para a aplicação da  pena capital e ao 
    ratificar o Quarto Convênio de Genebra sem reservas a esta norma.  
    Sendo assim, a Comissão considera que os Estados Unidos estão obrigados por 
    uma norma de jus cogens a não impor a pena capital a pessoas que 
    cometeram os delitos quando não haviam cumprido 18 anos de idade.  Como 
    norma de jus cogens, esta disposição obriga a comunidade de Estados, 
    incluidos os Estados  Unidos.  A norma não pode ser derrogada com 
    validade seja por tratado ou por discordância persistente o não de um Estado. 
    86.     Ao interpretar os 
    termos da  Declaração Americana à luz desta norma de jus cogens, a 
    Comissão conclui, no presente caso, que os Estados Unidos não respeitaram a 
    vida, a liberdade e a segurança da  pessoa de Michael Domingues ao sentenciá-lo 
    a morte por delitos que cometeu quando tinha 16 anos de idade, 
    contrariamente ao artigo I da  Declaração Americana. 
    87.     A decisão da 
    Comissão acima mencionada a leva a concluir também que  os Estados Unidos 
    serão responsáveis pela violação grave e irreparável do direito à vida de 
    Michael Domingues, consagrado no artigo I da  Declaração Americana, se vier 
    a executá-lo  por delitos que cometeu quando tinha 16 anos de idade. 
    
    
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      [16]
      
      O artigo 32 do Regulamento da Comissão dispõe: “A Comissão 
      considerará as petições apresentadas dentro dos seis meses contados a 
      partir da data em que a presumida vítima haja sido notificada da decisão 
      que esgota os recursos internos. 
      
      [17] O 
      artigo 33(1)(a) do Regulamento da  Comissão dispõe: “A Comissão não 
      considerará uma petição nos casos em que a respectiva matéria: a) 
      encontre pendente de outro processo de solução perante organização 
      internacional governamental de que seja parte o Estado aludido. 
      
      [18] O 
      artigo 33(2)(b) do Regulamento da  Comissão dispõe: “Contudo, a 
      Comissão não se absterá de conhecer das petições a que se refere o 
      parágrafo 1, quando: b) o peticionário perante a Comissão, ou algum 
      familiar, for a presumida vítima da violação e o peticionário perante o 
      outro organismo for uma terceira pessoa ou uma entidade não-governamental, 
      sem mandato dos primeiros. 
      
      [19] 
      O artigo 34 do Regulamento da  Comissão dispõe: “A 
      Comissão declarará inadmissível qualquer petição ou caso quando: a) 
      não expuserem fatos que caracterizem uma violação dos direitos a que se 
      refere artigo 27 do presente Regulamento; b) forem manifestamente 
      infundados ou improcedentes, segundo se verifique da exposição do próprio 
      peticionário ou do Estado; c) a inadmissibilidade ou a improcedência 
      resultem de uma informação ou prova superveniente apresentada à Comissão.
      
     
       
       
       
       
       
       
       
       
       
      
      
       
       
      
      
      
      
      
       
      
      
      [32] 
      A Comissão observa que a Corte Interamericana de Direitos Humanos entendeu 
      que a Convenção sobre os Direitos da Criança forma parte de um amplo 
      corpus juris internacional de proteção das crianças que deve servir a 
      Corte para fixar o conteúdo e os alcances da  disposição geral 
      definida no artigo 19 da  Convenção Americana. A Corte Interamericana 
      de Direitos Humanos, Caso Villagrán Morales e outros (“Crianças de rua”), 
      Sentença de 19 de novembro de 1999, Relatório Anual 1999, par. 194. Ver 
      também  CIDH, Relatório de Canadá, OEA/Ser.L/V/II.106 Doc 40, rev ( 28 
      de Fevereiro de 2000), par. 38 (que confirma que, embora a  Comissão 
      obviamente não aplica a Convenção Americana sobre Direitos Humanos em 
      relação aos Estados membros que ainda naõ a ratificaram, suas disposições 
      podem ser relevantes para informar uma interpretação dos princípios da  
      Declaração). 
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
      
      
      
      
      
      
      
      
      
      
      
      
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
       
      
       
       
       
      
      
      
       
       
       
       
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